Este período pós-Giro é o ideal para fazermos mais uma actualização e análise dos rankings do World Tour, da luta pela relegação. A última que tínhamos feito tinha sido a 12 de Abril, entretanto disputaram-se todas as clássicas das Ardenas e a primeira Grande Volta do ano, houve algumas alterações, mas a génese manteve-se.
Para quem é relativamente novo nesta temática, as licenças World Tour que a UCI vai atribuir para o triénio 2023-2025 terão como pilar fundamental o ranking do triénio 2020-2022, onde contam os pontos obtidos pelos 10 melhores ciclistas de cada equipa em cada um dos 3 anos. Serão atribuídas 18 licenças para esse triénio e realisticamente há 20 equipas a competir por essas 18 licenças, as actuais 18 equipas do World Tour mais a Alpecin-Fenix e a Arkea-Samsic (que já têm a licença World Tour virtualmente garantida pelo posicionamento no ranking). Resta então saber quais as equipas que vão ficar de fora.
A situação que relatámos em Abril mantém-se, só que menos extremada, Israel-Premier Tech e Lotto-Soudal têm conseguido recuperar pontos e aproveitar as temporadas menos boas que a EF Education-Easy Post e a BikeExchange estão a fazer. Desde 11/04 a 30/05 estas 2 equipas não passaram dos 608 e 756 pontos, respectivamente, enquanto a Israel-Premier Tech fez 896 e a Lotto-Soudal 1399. A última semana seguiu a mesma tendência, de aproximação à linha de água por parte das equipas de Chris Froome e Caleb Ewan.
Podemos considerar que, grosso modo, acima da Movistar estão todas a salvo, são 1600 pontos que separam Movistar e Israel-Premier Tech, com Lotto-Soudal, EF Education Easy Post, BikeExchange e Cofidis pelo meio. Esta é uma luta curiosa, que acontece essencialmente nas corridas europeias fora do World Tour, provas que dão muitos pontos e que não têm assim tanta concorrência. Estamos a ver certas equipas a adaptar, de certa forma, os seus calendários. A Lotto-Soudal inscreveu-se no Sibiu Tour, em Julho, a BikeExchange foi recentemente à Volta a Estónia e a Israel-Premier Tech inscreveu-se em várias clássicas neste mês de Junho. Os restantes calendários são bastante habituais e a EF Education Easy Post parece ainda estar em negação depois do mau Giro que teve e da temporada para esquecer que está a ter.
Movistar
Continua a super-dependência de Alejandro Valverde, chega a ser ridículo. A Movistar estava, sem sombra de dúvida, na zona de relegação sem Valverde. A equipa este ano tem 3357 pontos e mais de um terço vieram do veterano espanhol, que sozinho tem mais pontos do que Mas, Garcia Cortina e Aranburu juntos. O Giro nem correu muito bem, principalmente pelo desastre que foi a corrida de Ivan Sosa. A Movistar tem no colombiano um activo muito importante nesta batalha, mas tem de o usar de forma correcta, em provas por etapas curtas e com montanha, não em Grandes Voltas.
Durante os próximos 2 meses, Enric Mas vai ter de mostrar que é um líder e fazer bons resultados ao mais alto nível. Aliás, se o espanhol não andar bem no Dauphine, a formação espanhola pode ficar em apuros porque as próximas 2 semanas são recheadas de clássicas belgas e as rivais da Movistar vão somar muitos pontos. Já se começa a ver uma mudança dos ponteiros e da estratégia da equipa, o 2º posto de Oscar Rodriguez na Volta a Hungria valeu uns importantes 85 pontos.
Cofidis
Estão a fazer uma temporada fenomenal e estão praticamente a salvo, também porque vão continuar a somar muitos pontos nas clássicas francesas e belgas. Todas as contratações parece que foram na mouche e tudo está a correr às mil maravilhas, Ion Izagirre e Simon Geschke fazem pódios em corridas World Tour, Max Walscheid volta ao seu melhor nível, Jesus Herrada e Axel Zingle estão incríveis nas clássicas. O mais assustador é que estão neste momento no top 10 de equipas de 2022 em pontos com um dos seus líderes, Bryan Coquard, a desiludir bastante. O sprinter francês é apenas o 10º ciclistas com mais pontos em 2022 na Cofidis, até atrás de Piet Allegaert.
Benjamin Thomas justificou plenamente a sua contratação em Maio e entre os 4 dias de Dunkerque e a Boucles de la Mayenne fez 320 pontos, com Jesus Herrada também a fazer mais de 200 pontos no mês citado. O futuro parece risonho para a formação gaulesa, que nas próximas semanas irá alinhar em várias clássicas europeias onde tem chances de somar muitos pontos com corredores como Walscheid, Allegaert e Sajnok, mesmo como nos campeonatos nacionais, mais para o final do mês.
BikeExchange
As vitórias em etapa de Simon Yates e Matteo Sobrero salvaram o Giro da equipa australiana, o problema está na estruturação dos rankings, é que ganhar 3 etapas no Giro vale 300 pontos e ganhar 3 clássicas da categoria 1.1 vale 375 pontos. Portanto, enquanto Simon Yates fez 200 pontos no Giro, Dylan Groenewegen fez 185 entre a Veenendaal Classic e a Volta a Colónia, provas obviamente com graus de dificuldades bem distintos. A equipa já começa a mudar o chip, foi recentemente à Volta a Estónia claramente para somar pontos mas … o plano não correu assim tão bem quanto isso.
É que Kaden Groves ficou-se pelos 78 pontos visto que foi batido por Evaldas Siskevicius e Norman Vahtra na geral, algo que certamente não estaria nos planos. Faltam segundas linhas na formação de Matthew White, o 10º melhor ciclista da equipa tem apenas 78 pontos e isso significa pressão extra para Yates, Matthews e Groenewegen. A melhor estratégia poderia até ser enviar Luka Mezgec a algumas clássicas e Lucas Hamilton a algumas corridas mais secundárias, sem serem World Tour. Para as próximas semanas não levam nenhum líder para a geral do Dauphine (apenas Groenewegen para os sprints), vão apenas a 2 clássicas, poderão ficar ainda mais em apuros.
EF Education-EasyPost
A equipa em negação. Pode parecer que estão a salvo, só que 800/1000 pontos podem ser anulados num mês bom para as outras equipas. A situação é ainda mais preocupante porque os comandados de Jonathan Vaughters são a equipa com menos pontos do WT em 2022, até têm menos pontos que a UNO-X este ano. O que significa que, se descerem para o nível ProTeam nem acesso garantido têm às Grandes Voltas através do sistema de Wild Cards automáticos.
A temporada de clássicas foi para esquecer (Valgren e Bettiol nem aos 200 pontos chegam) e a situação seria bem pior se Hugh Carthy não faz uma terceira semana de Giro incrível e soma 200 pontos na primeira Grande Volta do ano. Porquê em negação? Claramente estão numa situação aflitiva e não parece que estão a fazer nada para a mudar, não estão a mudar o calendário inscrevendo-se nas corridas europeias de menor dimensão. Stefan Bissegger, com uns meros 71 pontos, ainda entra no top 10 de ciclistas da equipa com mais pontos este ano.
Lotto-Soudal
Em apuros desde o início do ano, a equipa nunca escondeu isso e apesar de algumas escolhas de calendário questionáveis e de um grande líder com um desempenho bem abaixo do esperado, ainda estão esperançosos. Tudo graças a um surpreendente Arnaud de Lie, que sozinho já fez mais de 1000 pontos em 2022, o dobro do segundo ciclista com mais pontos. O jovem belga tem sensivelmente o triplo dos pontos de Caleb Ewan, que teve um Giro para esquecer e que agora está focado no Tour.
Parte desta recuperação também se deve a ciclistas que estiveram apagados nas clássicas da Primavera e que recentemente encontraram as suas melhores pernas, falamos de Philippe Gilbert, completamente renascido das cinzas, e de Florian Vermeeesch, grande revelação do Paris-Roubaix do ano passado e que alcançou agora a primeira vitória como profissional. Este mês será absolutamente decisivo para a formação belga. Há várias clássicas na Bélgica e nos Países Baixos, é hora para Vermeesch, Gilbert e Arnaud de Lie continuarem a somar pontos, enquanto Steff Cras está também em boa forma e vai querer somar pontos em corridas por etapas de menor dimensão.
Israel-Premier Tech
A formação que teve mais problemas de saúde no início da temporada e que agora tem uma tendência ascendente muito grande. Os números indicam que estão relativamente longe da “linha de água”, mas ainda falta contabilizar os resultados desta semana. Entre Jakob Fuglsang e Michael Woods em França e Simon Clarke em Itália a Israel-Premier Tech somou quase 300 pontos, o que a deixa a cerca de 1000 pontos da EF. O desempenho destes 3 ciclistas vai ser fundamental para assegurar a manutenção no World Tour, todos passam bem a montanha e têm uma boa ponta final.
Tal como no caso da Lotto-Soudal, este mês será decisivo para somar pontos e encurtar a diferença para as equipas que estão mais acima, nomeadamente EF, Movistar e BikeExchange. As clássicas belgas poderão ajudar, a Israel vai participar na maioria delas e contam com um bloco interessante, ainda mais agora que Sep Vanmarcke está a regressar à boa forma. Também têm Tom van Asbroeck ou Mads Wurtz. Sendo uma equipa com bastantes nacionalidades, têm possibilidade de angariar muitos pontos nos Campeonatos Nacionais, nomeadamente nos contra-relógios, casos de Hollenstein na Suíça, Dowsett no Reino Unido ou Brandle na Áustria.