Os ciclistas continuam nos Pirineus e desta vez com subidas clássicas do Tour, o Aspin e o Tourmalet, noutro dia que promete ser decisivo e explosivo.

Percurso

Os primeiros 23 kms são planos, a velocidade vai rondar os 50 km/h nesta fase, todas as equipas vão querer colocar ciclistas na fuga. Segue-se uma 3ª categoria e se a escapada não se der aí há mais 25 kms planos, só que depois há logo o Col d’Aspin (12 kms a 6,5%). Não é uma subida muito complicada, raramente vemos grandes ataques aqui, serve mais como desgaste acumulado para o que aí vem.

E é precisamente a categoria extra do Col du Tourmalet, com os seus terríveis 17 kms a 7,4%, é uma das ascensões mais duras do Tour e vem logo na 6ª etapa. Os números são enganadores, os primeiros 4 kms são muito acessíveis, a partir daí nunca desce dos 7,5% e há mesmo uma parte no miolo que tem 2 kms a 9,7%, os principais ataques devem surgir aí. O topo está a 47 kms da meta, a descida é longa, o vale nem por isso, até que os ciclistas entram na subida final que nem é assim tão dura quanto isso. Cauterets contabiliza 16,2 kms a 5,3%, o que conta mesmo é dos 5 aos 2 kms para a meta, com quilómetros de 10,3%, 9,6% e 8,3%, o resto é bastante rolante até.

Tácticas

Depois do que aconteceu hoje muito há para falar nesta parte. O que sucedeu hoje não foi tanto mestria ou genialidade táctica, mas sim adaptação às circunstâncias de corrida. Os inícios de etapa loucos são mesmo assim, todos os principais ciclistas da Bora-Hansgrohe estavam bem colocados, o corte ocorreu e depois tiveram de seguir um novo plano, não iam recuar só porque isso não era o idealizado. A partir daí julgaram a situação na perfeição e beneficiaram que Lidl-Trek e Ineos-Grenadiers também tinham interesses. No pelotão a UAE Team Emirates assumiu a responsabilidade de forma natural, tinha a amarela e entre Pogacar e Vingegaard era o esloveno naquele momento com mais a perder. Minimizaram as perdas para Hindley ao máximo, não entraram em pânico e maximizaram o bloco que tinham, só que infelizmente para eles este Kuss é melhor do que qualquer gregário que eles têm e Vingegaard mostrou que neste momento é o melhor.




Isto foi um golpe especialmente duro por alguns motivos. Primeiro porque a moral estava bem em altas, depois de ter perdido o Tour 2022 da maneira que aconteceu, com superioridade clara de Vingegaard, havia a sensação de mais jogo igual este ano apesar sem ter havido um grande teste, antes desta etapa a UAE tinha 1º e 2º, Pogacar tinha ganho 11 segundos a Vingegaard e sai daqui com um grande barrete e com a equipa de rastos. Os últimos dias tinham sido festejos, brincadeiras, colocar a pressão em cima de Jumbo-Visma pela situação de Wout van Aert e de repente ficam de pé atrás.

A situação actual e o ocorrido hoje creio que tem repercussões nefastas para o espectáculo a médio prazo. Pogacar não vai correr o risco de colocar a equipa a trabalhar amanhã e ser descarregado no Tourmalet e o domínio de Vingegaard meteu medo a muitos dos outros rivais, que na cabeça agora têm como derrotar Hindley ou Pogacar pelo pódio, não como bater Vingegaard para o título. O ciclismo ofensivo que se viveu hoje acho que foi mais sorte do que risco, até porque em Grandes Voltas anteriores viu-se que a Bora-Hansgrohe até é muito ponderada e pragmática nestas questões, Hindley não pensou “tenho de fazer qualquer coisa de especial para bater estes 2 aliens”.

E amanhã? A minha análise é que a UAE Team Emirates não vai pegar na corrida, a Bora-Hansgrohe não tem bloco de montanha para controlar o Tourmalet, tudo se resume à atitude da Jumbo-Visma e à constituição da fuga. Esta pode ser a última oportunidade de espectáculo na montanha em 1 semana porque se vão extremar diferenças e neste momento há quase 30 ciclistas a 6 minutos ou menos do líder. Basta 1 desses corredores integrar o grupo dianteiro para obrigar a um controlo maior porque parte do pelotão e cabe à equipa holandesa decidir se quer tentar dar quase a estocada final neste Tour numa perspectiva de não deixar que a condição física de Pogacar melhore durante as 3 semanas.

Estou inclinado para essa opção, a margem de quase 1 minuto de Vingegaard para Pogacar ainda não é confortável e o Tourmalet tem potencial para diferenças incríveis, a estratégia deve passar por enviar novamente Benoot e van Aert para a frente, podendo estes ser muito úteis depois do Tourmalet, já se viu hoje que Kelderman e Kuss são suficientes para fazer uma diferença enorme na montanha. Creio que a a formação holandesa quiser mesmo fazer diferenças a fuga não tem diferenças, mas também acho que um vencedor fora dos favoritos só pode aparecer da fuga.

Favoritos

Jonas Vingegaard – Depois do que vimos hoje é inevitável colocá-lo porque parece estar a 100% e pode existir vontade da Jumbo-Visma de fazer já diferenças para Pogacar para depois ter um Tour mais tranquilo e eventualmente poder ganhar margem para um percalço. A etapa de amanhã tem até mais potencial para fazer diferenças, é que o Tourmalet é mais longo e vai a uma altitude superior em relação a hoje e sabe-se que Pogacar não está confortável nessas condições. Será preciso ajuda depois do Tourmalet e se isso acontecer aí pode ser desastroso para o esloveno, se a Jumbo-Visma colocar Wout van Aert na fuga por exemplo.




Thibaut Pinot – Disse-o em cima e volto a reiterar, acho que só uma fuga pode ganhar a etapa para além de Vingegaard, portanto todas as outras opções seguintes serão nesse cenário. Vejo com bons olhos as chances do francês, esta é uma etapa mítica daqueles que ele gosta mesmo e sonha ganhar na despedida, a forma depois do Giro ainda está boa e vamos ver durante quanto tempo. Já está a quase 5 minutos, terá alguma liberdade e se eventualmente quiser a camisola da montanha é aqui que vai começar a construir esse legado.

Outsiders

Thomas Pidcock – Outro ciclista bem enigmático e que já provou que gosta dos grandes momentos e das grandes etapas. Carlos Rodriguez é o líder declarado da Ineos e tem Daniel Martinez para o apoiar, Pidcock não será necessário nesse departamento e sabe que tem de atacar se quiser ter hipóteses de um top 5 final. É um especialista em descidas que também parece estar a progredir em termos de forma.

Ben O’Connor – A Ag2r tentou hoje com Felix Gall, será que amanhã vai arriscar com Ben O’Connor? Finalmente chegaram as montanhas mais longas, o terreno predilecto do australiano que já está a 3:34 na classificação geral, não será dos ciclistas mais marcados. Parece-me ser dos corredores que recupera bem dos esforços entre dias de montanha, tem de fazer qualquer coisa para começar a corrigir o seu lugar na geral.

Nick Schultz – A Israel-Premier Tech está a fazer uma corrida bem agradável de se acompanhar, um pouco como no Giro. Tem Woods bem colocado, hoje Neilands esteve em destaque na fuga, Nick Schultz tem passado mais discreto, entre os pingos da chuva, hoje chegou com Dylan Teuns. Terá liberdade plena e é preciso recordar que já em 2022 ele esteve muito próximo de vencer uma etapa.

Possíveis surpresas

Tadej Pogacar – Levou um golpe hoje psicologicamente, podia-se levantar a hipótese de querer atacar de longe, mas o mais prudente é esperar que as melhores pernas apareçam na 3ª semana e minimizar perdas até lá.

Jai Hindley – Foi incrível hoje, mas foi algo de um desgaste enorme, veremos se não passa factura disso mesmo amanhã.




Adam Yates – Seria uma maneira um pouco diferente da UAE Team Emirates colocar pressão da Jumbo-Visma, ter um plano de colocar Yates na frente, para antecipar um possível ataque de Vingegaard, não pode desperdiçar o facto de ter 2 ciclistas no top 6.

Pello Bilbao – Muito inconsistente neste Tour até agora, esteve muito mal na 1ª etapa, bem no 2º dia, desiludiu novamente hoje. O basco não é corredor de deitar a toalha ao chão e com Landa mais direccionado a seguir os favoritos pode haver fuga amanhã para Bilbao.

Felix Gall – É aproveitar esta condição física enquanto a tem, hoje provou que na montanha está a fazer jogo igual com corredores que são candidatos ao pódio e ao top 5. Já na Volta a Suíça estava a andar muito bem e é alguém que não tem na descida a sua maior qualidade, portanto sai beneficiado com um final em alto.

Dylan Teuns – Hoje perdeu tempo, resta saber se pela pequena queda que teve, por falta de pernas ou por opção, é que estava demasiado perto na geral para ter liberdade plena. Impressionou na alta montanha suíça, pode fazê-lo aqui novamente.

Ruben Guerreiro – Não se desligou muito da corrida, chegou com Teuns inclusivamente. Caso tenha poupado forças mesmo assim é indicador de que está em boa forma e quando é assim é sempre um potencial candidato em etapas destas.

Ion Izagirre – É sempre um ciclista perigoso e mortífero nestes cenários. Já está muito afastado na geral, não tem propriamente um grande líder para trabalhar e tem vindo a poupar forças. O basco disputa provas de 1 semana com os melhores do Mundo, só tem de encontrar essas pernas aqui.

Clement Champoussin – Fez um belíssimo Dauphine, esteve bem na clássica do Mont Ventoux, não há razões para pensar que não pode ganhar 1 etapa neste Tour.

Matteo Jorgenson – Ainda não parece a 100%, mas parece estar claramente em subida de forma, principalmente tendo em conta o que mostrou no Dauphine. Um dos melhores ciclistas da primeira metade do ano, não pode ser descartado numa etapa destas.

Super-Jokers

Os nossos Super-Jokers são: Rigoberto Uran e Tobias Johannessen

By admin