Vai para a estrada amanhã mais uma edição da Volta ao Algarve e novamente com um pelotão de luxo! Aqui estaremos para acompanhar todas as peripécias, por agora resta analisar o percurso e os favoritos da “Algarvia”.
Percurso
Etapa 1
Tal como em 2023, as cidades de partida e chegada são as mesmas e a distância também, cerca de 200 kms entre Portimão e Lagos para abrir as hostilidades. O traçado em si é ligeiramente diferente, volta a haver 2 contagens de montanha que são uma belíssima oportunidade das equipas portuguesas subirem ao pódio no final da etapa. A aproximação é igual, uma zona técnica antes do quilómetro final e depois uma longa recta. Em 2023, a Groupama-FDJ dominou as operações até que Soren Waerenksjold apareceu para lançar Alexander Kristoff na perfeição. Fabio Jakobsen tinha ganho em 2020 e 2022.
Etapa 2
Chegada ao Alto da Fóia, uma subida que em si não é muito complicada, pelo menos nesta vertente, tem 7,7 kms a 6% e como muitas vezes está vento frontal resume-se ao último quilómetro, até por vezes com sprints em grupo reduzido. Há vários acessos e aproximações possíveis à Fóia, este ano os ciclistas vão fazer Alferce (3 kms a 7,1%) e Pomba (3,8 kms a 7,9%), que na minha opinião, pelas rampas e não pela extensão das mesmas, é mais dura do que subir à Picota antes.
Isto quer dizer que um ritmo elevado vai exponenciar diferenças e, eventualmente, partir o grupo. Tirando 2021, quando a prova foi disputada em Março, a última vez que esta sequência tinha acontecido foi em 2020, um ano em que João Almeida lançou Remco Evenepoel para a vitória num grupo com pouco mais de 1 dezena de corredores.
Etapa 3
Vila Real de Santo António e Tavira são 2 cidades muito próximas, a organização consegue esta quilometragem toda com uma incursão não muito dura pela Serra Algarvia, com 2 contagens de 3ª categoria. Este é um final algo traiçoeiro, em 2023 um ataque aquando de um sprint intermédio originou uma fuga que deu vitória a Magnus Cort e bonificações a Filippo Ganna. O grupo era forte demais e o terreno acessível e rápido demais para ser alcançado, são estradas relativamente expostas ao vento. O final em Tavira é técnico, quem entre para lá do 5º lugar na última viragem não tem hipóteses.
Etapa 4
Desta vez o contra-relógio individual é em Albufeira, junto à marina. A distância é muito comum para a Volta ao Algarve, 22 quilómetros e estará certamente entre os 15 maiores do ano, o que configura um importante teste para os especialistas. Apesar da originalidade do traçado, até é dentro do que os ciclistas que fazem esta corrida estão habituados, 2 pequenas colinas, um percurso rolante e exposto no miolo do mesmo e uma ou outra zona mais técnica, é sempre mais duro o que parece, o que permite aos trepadores andarem ali a rondar o top 20.
Etapa 5
Ai Malhão, Malhão, que estragos vais fazer no pelotão? Com partida de Faro, é uma jornada muito dura para esta altura do ano, um carrossel pela Serra Algarvia, com passagens pela Picota, Vermelhos e Alte antes do Alto do Malhão, repleto de fãs da modalidade ao longo dos 2500 metros a 9,8%. Haverá 2 passagens pela icónica subida e curiosamente há uma colina com 1100 metros a 10%, uma autêntica parede, entre passagens, que até agora nunca foi aproveitada para lançar ataques porque se guarda tudo para os últimos quilómetros.
O Clima
A previsão é favorável para Quarta, mas para Quinta-Feira a maioria dos modelos meteorológicos apontam para rajadas de vento até 50 km/h na Fóia e … chuva, pontualmente acompanhada de trovoada. De Sexta para a frente, para Tavira, Albufeira e o Malhão estão previstas condições quase perfeitas para a prática da modalidade. Uma pequena nota, de Vila Real de Santo António para Tavira o vento estará tendencialmente lateral, mas não lateral/costas e dificilmente com intensidade suficiente para causar estragos.
Táticas
A única alteração de fundo que a organização tem feito é mudar a ordem das etapas do Malhão e do contra-relógio, a última vez que o Malhão encerrou a Volta ao Algarve foi em 2022 quando ganhou … Remco Evenepoel. Diria que teoricamente, colocar o contra-relógio a fechar obriga a uma etapa do Malhão mais endurecida por parte dos trepadores porque por vezes quando eles levam uma “tareia” no esforço individual sabem que a geral está perdida e resta lutar pela vitória em etapa, nesse caso não se pode arriscar tanto.
Não me lembro de alguém chegar à Volta ao Algarve com tanto favoritismo com Remco Evenepoel em 2024, principalmente depois do que ele mostrou na Figueira Champions Classic. Para se ganhar esta corrida tem de se estar em boa forma, ser um bom contra-relogista e andar na montanha com os melhores. Remco cumpre isso tudo e a Soudal-Quick Step sabe que para ganhar estas 2 provas tinha de trazer um bloco recheado de bons ciclistas na montanha.
Acho que mano-a-mano ninguém vai conseguir bater o belga, veremos se alguma equipa com armas joga o tudo por tudo na etapa da Fóia ou do Malhão. Não estou a ver outro modo de ganhar a Evenepoel. Num ciclismo cada vez mais pragmático onde todos os pontos para o ranking UCI contam, não esperem disso de equipas que estão com alguns apuros no ranking, depois tem de se trazer um bloco forte e com múltiplas opções, portanto só estou a ver a Visma e a Ineos com, eventualmente, capacidade e vontade de fazer isso porque não é esse muito o estilo da Bora, a UAE vem com uma equipa muito jovem e a Lidl-Trek com poucas opções e que ainda não mostraram muito em 2024. A única maneira de ganhar a Evenepoel é isolá-lo antes da Fóia ou do Malhão, e depois atacá-lo, mas desta minha leitura à realidade provavelmente ainda há alguma distância, o mais provável é vermos uma edição semelhante aos últimos anos. Atenção que nesta perspectiva de “invenções tácticas” é importante ver quem está no carro pelas equipas.
Favoritos
Remco Evenepoel – O maior candidato por tudo o que já disse acima. Diria que no contra-relógio de Tavira não seria um escândalo se apenas Ganna, van Aert e Kung ficassem a menos de 30 segundos dele, o que atesta bem as diferenças que pode fazer. Cattaneo e Knox deram boas indicações na Figueira, Serry também, a equipa está dedicada à sua causa. Remco é jovem, é ambicioso, está ainda com aquela mentalidade de ganhar todas as corridas em que entra, não o estou a ver a ficar para trás na Fóia e mesmo que lhe ganhem 5/10 segundos no Malhão não é suficiente para recuperar o défice.
Daniel Martinez – Campeão em título, merece ser mencionado principalmente pelo conhecimento que também já tem do percurso e da corrida e sabe o que é preciso fazer para ganhar. No ano passado fez um contra-relógio surreal, talvez o melhor da sua carreira, perder apenas 16 segundos para Kung é um feito enorme e para voltar a triunfar precisa de fazer o mesmo e esperar um dia mau de Evenepoel. É muito hit or miss, está aqui caso volte a fazer um hit.
Outsiders
Wout van Aert – Uma preparação diferente para uma época diferente. É a primeira vez que o belga vem aqui para preparar as clássicas e outros objectivos e até já chega com algum ritmo, muitas vezes iniciava o ano só na Omloop ou na Strade devido ao ciclo-crosse. Será dos poucos que se consegue aproximar de Evenepoel no contra-relógio, creio que a Fóia não será problema para ele, mas tenho dúvidas relativamente às rampas do Malhão, acho que está muito no limite para o belga nesta fase da época pelo menos. Precisa de também conseguir algumas bonificações.
Filippo Ganna – Foi uma pequena loucura no ano passado colocá-lo entre os favoritos, justificada pelo seu 2º lugar à geral. Desta vez não sei se vem com o mesmo objectivo, este ano creio que está mais focado nas clássicas e nos Jogos Olímpicos portanto a condição física pode não ser a mesma. A presença de Evenepoel deixa-o sem aquela referência de aguentar a diferença ganha no contra-relógio durante as subidas porque o belga até poderá ganhar-lhe tempo no esforço individual.
Ben Healy – Um bocadinho à imagem de Martinez, big hit ou big miss. É daqueles ciclistas que rola muito bem sozinho e que não tem medo de atacar e a EF Pro Cycling por vezes até arrisca um pouco. Defende-se bem no contra-relógio e já se viu que sobe bem, depois de uma época de revelação seria aqui o início da afirmação de Ben Healy.
Possíveis surpresas
Stefan Kung – Na mesma onda de Filippo Ganna: fazer um bom contra-relógio, minimizar ao máximo as perdas na montanha e ver o que dá para fazer. Creio que top 10 é realista.
Thomas Pidcock – Perderá sempre muito tempo no contra-relógio, vem para se testar e tentar ganhar 1 etapa entre a Fóia e o Malhão. É um ciclista que gosta muito de correr em Portugal.
Sergio Higuita – Tal como Pidcock, o que ganhar na montanha vai perder muito mais em Albufeira, mas no estado de forma em que está diria que é um dos grandes candidatos a ganhar no Malhão.
Geraint Thomas – Estará na lista de muitos pelo nome e pelo currículo que tem, acho que nesta fase da carreira não liga minimamente a estas provas, está focado em preparar o Giro e o Tour, virá apenas aquecer os motores.
Rui Costa – Gosta sempre de correr em Portugal, é tradicionalmente muito consistente e completo, julgo que ficará no top 10.
Tao Hart – Tem aqui um importante ano na carreira e dos nomes que disse nesta categoria é daqueles que mais probabilidade tem de terminar no pódio. Costuma andar bem no início da época, defende-se bem sobre a “cabra” e gosta deste tipo de finais.
Andreas Leknessund – Tem as características certas para esta prova e o apoio total da sua equipa, é um outsider muito interessante para um top 5. A Uno-x é uma equipa que dá gosto ver correr e que costuma maximizar os seus resultados.
Isaac del Toro – Foi incrível no Tour Down Under, pagou um bocadinho o preço da audácia na Figueira. Está aqui porque é um ciclista muito ofensivo e é daqueles que acredito que não tenha medo de atacar.
Sepp Kuss – Fez bons contra-relógios na Vuelta, aqui acredito que seja diferente. A fase da época é outra e apesar de estar a andar bem ainda não terá essa condição física, apesar de ser um perigo nas etapas de montanha, pode perfeitamente fazer top 10 na geral.
Tiesj Benoot – Foi 8º em 2017 quando era muito novo, entretanto transformou-se em alguém que é mais candidato a corridas de uma semana. No entanto, não anda bem o suficiente no contra-relógio nem consegue fazer diferenças na montanha, o objectivo será melhorar esse 8º posto.
Thibault Guernalec – Candidato ao top 10.
Super-Jokers
Os nossos Super-Jokers são Magnus Sheffield e António Morgado.