Com os rumores que havia já se previa que esta janela de transferências fosse profícua no que toca a sprinters, nestes primeiros dias de mercado “aberto” já houve indicações disso, principalmente no que toca a nomes mais “secundários” e ciclistas mais jovens.

A transferência mais sonante de todas foi a mudança de Jonathan Milan da Bahrain-Victorious para a Lidl-Trek. O jovem poderoso italiano de 22 anos foi uma das confirmações da temporada ao fazer um Giro incrível, que se saldou pela conquista de 1 etapa e 4 pódios, que o levaram a averbar a classificação por pontos. Algo que é ainda mais incrível se pensarmos que mostrou rendimento durante as 3 semanas aos 22 anos na sua estreia em Grandes Voltas. Com um estilo parecido ao de Marcel Kittel e com uma fisionomia similar à do alemão, provou que também consegue passar as montanhas e já será visto como uma real ameaça e como um grande candidato a outros voos em 2024.



O contrato é válido por 3 anos, a Lidl-Trek acredita nele e acho que não é só para os sprints, poderá eventualmente a começar a apostar nele nas clássicas do empedrado, mais vincadamente no Paris-Roubaix. A contratação de um segundo grande sprinter (a equipa já vê Theuns e Stuyven somente como lançadores) também irá permitir que haja menos pressão em cima de Mads Pedersen, deixando o dinamarquês mais solto para objectivos específicos. Acredito que para já Milan faça o Giro e Pedersen o Tour, podendo concentrar mais a sua preparação em alguns meses do ano. Obviamente para a Bahrain esta é uma perda importante, mas não podemos esquecer que esta é uma equipa mais focada nas Grandes Voltas e que fica com Bauhaus (e eventualmente Govekar) para os sprints.

A Quick-Step prepara-se para renovar a sua frota de sprinters por completo, numa operação que também envolve a mudança quase completa de estratégia em benefício do bloco de trepadores em volta de Remco Evenepoel. A equipa tinha 3 sprinters em 2023 e prepara-se para perder 2 deles, Fabio Jakobsen está na porta de saída e foi nestes últimos dias anunciada a transferência de Ethan Vernon, permanecendo apenas Merlier face a esta época. Vernon era visto como uma terceira opção, não tinha grande comboio dedicado, daí a sua opção pela Israel-Premier Tech.

O britânico, para além de bom finalizador, sempre se mostrou um bom contra-relogista nas camadas jovens (foi 7º nos Mundiais sub-23) não fosse ele também um corredor da pista. Entrou no World Tour aos 21 anos e correspondeu em plano na primeira época, ganhou 2 etapas na Eslováquia e até se estreou ao mais alto nível com um triunfo na Catalunha. Não que este ano lhe esteja a correr mal, 4 vitórias inclusivamente 1 no Tour de Romandie, num dia em que sobreviveu às dificuldades, ao contrário da maioria dos sprinters, outra boa característica que tem. Creio que será um bom casamento, na Israel vai ter espaço para brilhar, eventualmente fazer a sua primeira Grande Volta, e a equipa precisa dos pontos que ele fará e precisava deste rejuvenescimento do plantel. Se pensarmos que Nizzolo está de saída, que Strong não é um puro sprinter e que ainda estão lançadores como Zabel, Asbroeck ou Wurtz poderá ser muito proveitoso para Ethan Vernon.



Como segundo sprinter da equipa perfila-se um jovem, uma das maiores promessas norte-americanas dos últimos tempos, Luke Lamperti. Está a completar a sua formação na Trinity Racing e a fazer uma temporada incrível aos 20 anos, começou por ganhar na abertura da Volta ao Alentejo, picou o ponto no Circuit des Ardennes e no Tour de Bretagne, foi à Volta ao Japão vencer 3 tiradas e ainda ganhou no Giro Next Gen. Recentemente foi à Volta a República Checa provar que já consegue competir contra sprinters das equipas ProSeries. Obviamente 2024 será um ano de adaptação, irá entrar apenas com 21 anos, mas se há coisa que a Quick-Step costuma fazer é dar um calendário adequado a este tipo de ciclistas, lembrando que Lamperti adora sprints com alguma dureza, que acabem em ligeira subida.

Falando em Giacomo Nizzolo, o veterano italiano está de regresso a uma estrutura que bem conhece. Depois de dois anos relativamente fracos na Israel-Premier Tech (somente 2 triunfos), Nizzolo volta à equipa liderada por Doug Ryder, neste momento a Q36.5 Pro Cycling para liderar a equipa nas clássicas e nos sprints. Já com 34 anos, o italiano está longe dos tempos em que era presença assídua entre os primeiros nas chegadas rápidas das principais competições do calendário velocipédico (venceu no Giro, duas vezes a classificação por pontos, o Campeonato da Europa, entre outros) no entanto ainda se consegue posicionar bem e, a espaços, consegue bons resultados, como a vitória na Tro-Bro Leon deste ano. Será importante para somar pontos para o World Ranking, a regularidade conta muito, e dará outra opção para a equipa nos sprints, já que este ano, e ainda sem contrato renovado, a Q36.5 apenas conta com Matteo Moschetti neste departamento.

O percurso de Max Kanter como ciclista é dos mais curiosos e interessantes que se pode seguir, todos os que acompanharam a temporada que ele fez em 2018 como sub-23 diriam que neste momento estaria pelo menos um nível acima em relação ao que está. 2º no Tour des Flandres sub-23, 4º na Boucles de la Mayenne, campeão nacional sub-23, 2 pódios na Volta a Dinamarca contra excelentes sprinters e até ganhou na Volta a França do Futuro. Subiu à equipa principal da DSM só que uma queda e lesão grave logo a abrir 2019 atrasou o seu desenvolvimento. Em 2020 ainda se pensou que estaria de volta porque terminou a época a fazer 2 pódios na Vuelta (apenas batido por Ackermann e Bennett). 2021 viu-o perder muito espaço interno e precipitar uma saída, no caso para a Movistar e a temporada até correu muito bem, a equipa precisava desesperadamente de pontos, então o alemão teve rédea mais solta para sprintar e não esteve amarrado a Gaviria e Cortina. 4º na Milano-Torino, 4 top 10 na Volta a Polónia, pódios em semi-clássicas belgas, foi dos mais regulares e dos mais fiáveis da equipa, cumpriu o seu papel na perfeição.



Numa gestão no mínimo contestável, o que faz a Movistar a um ciclista de 24 anos que parece estar a recuperar as melhores sensações e que com liberdade já provou que consegue vários top-5? Amarra-o a Gaviria (Polónia, Giro) ou a Cortina (Paris-Nice), no Saudi Tour, onde teve liberdade e mesmo ajudando a vitória à geral de Ruben Guerreiro fez 3 top-5. Resta saber o que foi falado entre Kanter e a Astana, creio que o alemão ainda tem capacidade para fazer bons resultados mesmo no World Tour, para ser um sprinter um pouco como Consonni ou Bouhanni e na Astana até pode ficar um pouco preso a Cavendish (caso ele continue) nos primeiros tempos, mas se depois a Astana quiser ficar com ele e Cees Bol como sprinters então maravilha para o alemão, abrem-se várias portas. Isto porque acredito que Cavendish faça mais 1 ano já que se mostrou competitivo e que tenha exigido melhor apoio no final das etapas, portanto Kanter não será sprinter em provas World Tour em 2024, talvez em 2025.

Para terminar este artigo sobre sprinters só falta falar de Clement Venturini, que depois de 4 épocas na Cofidis e 5 na Ag2r, se decidiu mudar para a Arkea. Venturini tem 29 anos e é aquele ciclista que não é muito vencedor (4 triunfos na carreira), mas que é um garante de top 10 ao longo do ano e de lutar constantemente pela Taça de França, ele adora um sprint com alguma dificuldade. Eu não acho que ele saia à procura de mais espaço ou de oportunidades, aos 29 anos e com este currículo isso já não acontece e até se pode argumentar que na Arkea até tenha menos por causa de Demare. Também não creio que tenha sido contratado para fazer parte do comboio de Demare, não tem propriamente esse perfil. Portanto, para o ciclista deve ter sido vantajoso financeiramente e a Arkea queria uma terceira opção de sprint (atrás de Demare e Dekker) que fosse fiável para as corridas internas e que também fosse somando pontos para o World Ranking.



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