Foi com relativa surpresa que a comunidade velocipédica recebeu ontem o comunicado da Astana que dizia o seguinte, “A Astana descobriu novos elementos que mostram a provável ligação entre Miguel Angel Lopez e o Dr. Marcos Maynar. Em conformidade, a equipa não teve alternativa e terminou o contrato com efeito imediato entre a equipa e o ciclista, com base nas regras internas e nas violações do contrato.”

O corredor colombiano que terminou em 4º na Vuelta emitiu também ele um comunicado nas redes sociais onde considera a decisão altamente injustificada e informa que irá exercer todas as acções legais possíveis para reverter esta decisão e para defesa dos seus direitos, visto que entende ser um claro caso de despedimento abusivo.




Voltando um pouco com o filme atrás, Miguel Angel Lopez saiu da Astana no final de 2020 para reforçar a Movistar, uma aventura que até estava a correr relativamente bem até à penúltima etapa da Vuelta. O colombiano era 3º da geral à partida, ficou numa situação de corrida complicada onde estava a perder o pódio e decidiu deixar a bicicleta e abandonar em clara discórdia com as opções estratégicas da equipa. A situação ficou insustentável e o contrato ficou sem efeito, mesmo tendo sido renovado semanas antes. Voltou à Astana em 2022, fez um início de época bem discreto, abandonou o Giro de uma forma um bocado estranha e apareceu novamente em boa forma na Vuelta, terminando no 4º posto.

E quem é Marcos Maynar? É um dos protagonistas da Operação Ilex, operação anti-doping realizada pelas autoridades espanholas. No Verão veio à baila uma investigação a decorrer cujos protagonistas eram Marcos Maynar, um médico que é conhecido por realizar planos de treino e que supostamente, segundo as autoridades, forneceu substâncias dopantes, Vicente Belda e o seu filho (este massagista da equipa Astana) e 2 responsáveis por uma equipa elite e sub-23 do pelotão espanhol. Neste processo estava envolvido Miguel Angel Lopez, que foi ouvido como testemunha e cujo contrato foi renovado há pouco tempo.

No âmbito deste processo também foi ouvido Ruben Pereira, director desportivo da Glassdrive/Q8/Anicolor, equipa que dominou o panorama do ciclismo em Portugal esta época, principalmente na Volta a Portugal depois do afastamento da W52-FC Porto. Este facto veio à baila numa notícia veiculada pelo diário desportivo “A Bola”, no final de Novembro, e Ruben Pereira explicou que os factos são referentes a 2021, quando a equipa ainda era patrocinada pela Efapel. “Fomos ouvidos, em 2021, sobre os planos de treinos elaborados pelo Nacho [intermediário de Marcos Maynar] para a nossa equipa.” Isto porque entre os documentos confiscados pelas autoridades estavam os planos de treino de alguns corredores desta equipa. “Depois das explicações dadas sobre a nossa relação com Nacho, nunca mais tivemos qualquer informação e ficámos surpreendidos com as notícias agora divulgadas. Terminámos a nossa ligação com esse senhor em agosto de 2021, nunca tivemos nada a ver com Marcos Maynar e muito menos com a utilização de substâncias ilícitas. A nossa ligação foi exclusivamente no plano de treinos” explicou Ruben Pereira em declarações dadas ao jornal.




Para os que seguem ciclismo há mais tempo este nome de Marcos Maynar não deve ser estranho. Em verdade, Maynar é um verdadeiro coleccionador de suspensões. Foi detido em 2004 numa investigação a substâncias dopantes em ginásios, foi suspenso durante 10 anos pela FPCiclismo “por, durante a época desportiva de 2008, ter prescrito e/ou fornecido substâncias proibidas e mascarantes a alguns ciclistas” da LA-MSS.”, esteve envolvido numa investigação anti-doping numa equipa de remo em 2015. O processo que decorreu entre 2008 e 2010 levou ao fim da equipa na altura comandada por Manuel Zeferino e à suspensão de 4 dos corredores.

Outros intervenientes curiosos e com um longo passado de doping é a família “Belda”. David Belda é um antigo ciclista, agora massagista da equipa Astana, que em 2014 venceu de forma relativamente surpreendente 2 etapas na Volta a Portugal ao serviço da Burgos-BH. Mais tarde, em 2017, viria a ser suspenso por violação do passaporte biológico e é filho de Vicente Belda, outro antigo ciclista e com uma história ainda mais curiosa. Em 2000 passou a ser director-desportivo da mítica Kelme, que contava com ciclistas como Santiago Botero, Oscar Sevilla e Alejandro Valverde, em 2004 o ciclista Jesus Manzano veio a público denunciar as práticas de dopagem usadas na equipa e a organização do Tour proibiu a presença desta estrutura. Mais tarde, a Operação Puerto viria a acabar com a Kelme, tendo como consequência vários detidos e muitas suspensões de ciclistas.




Entretanto, o diário espanhol “abc” veio desvendar um pouco mais do que terá acontecido com Miguel Angel Lopez no Giro. Os novos elementos de que a Astana fala será, supostamente, a confissão de David Belda de que este realmente levou para a Hungria uma substância que facilita o crescimento muscular e a eliminação de líquidos para administrar a Miguel Angel Lopez. O estranho abandono do colombiano na 4ª etapa na altura foi justificado por uma queda sofrida e consequente lesão na perna, agora fala-se que foi a injecção da substância que correu mal e isso causou um inchaço bastante incómodo na perna ao ciclista de 28 anos, que o obrigou a falhar também o Tour meses mais tarde.

By admin