Não foi propriamente uma má época, a questão é que a formação britânica tem grandes ambições e grandes objetivos e de certo modo sentiu-se que ficaram ainda mais longe do nível de UAE Team Emirates e Jumbo-Visma. Não conquistaram qualquer Monumento ou Grande Volta.

 

Os dados

Vitórias: 36 triunfos, contra os 39 do ano passado, e apenas 9 foram no World Tour

Pódios: Conseguiram superar a centena com 104 pódios, menos 16 em relação a 2022.

Dias de competição da equipa: Voltaram a competir relativamente pouco, com 254 dias, não é uma estrutura que faça assim tantas corridas fora do World Tour.

Idade média do plantel: Rejuvenesceram ligeiramente o plantel, passaram de 28,8 para 28,1 anos, contam com 9 corredores acima dos 33 anos.

Mais kms: Jonathan Castroviejo, um elemento importante na estrutura, fez 12 264 kms.

Melhor vitória: A que mais fica na retina é a de Thomas Pidcock na Strade Bianche, quando atacou de longe e aguentou a perseguição de um grupo de elite para ganhar em Siena.

 

O mais

Filippo Ganna foi ao longo do ano o melhor ciclista da Ineos-Grenadiers e fez mesmo a melhor época da sua carreira aos 27 anos. Mostrou uma polivalência nas clássicas e ao sprint que ainda não tínhamos visto até agora, prova disso foi o 2º posto na Milano-Sanremo aguentando o ritmo de “aliens” e a Vuelta que fez (conquistou 1 etapa e fez por 3 vezes 2º).  Foi 2º na Volta ao Algarve e na Vuelta a San Juan no início do ano provando que também é um nome a ter em conta nas corridas por etapas de 1 semana, foi vice-campeão do Mundo de contra-relógio e até foi 6º no Paris-Roubaix, uma corrida que será um grande objectivo de carreira para ele.




Thomas Pidcock mostrou que na estrada está a evoluir e destacou-se precisamente no terreno que achamos onde pode ser realmente perigoso. Esteve a muito bom nível nas clássicas, ganhou a Strade Bianche, foi 3º na Amstel Gold Race e 2º na Liege-Bastogne-Liege, devia ser aqui o “core” da aposta. Voltou a ir ao Tour com pensamento na geral, mal atacou, ficou em 13º.

Tao Hart fez um início de temporada que prometia e muito, tudo estava alinhado para repetir o que já tinha feito no Giro e mesmo na prova italiana estava a impressionar até ser forçado a abandonar e a partir daí não competiu mais. Pavel Sivakov, de saída da equipa e sem nada a perder, foi mais ofensivo do que nunca, foi bom de ver. Infelizmente na UAE Team Emirates terá de esfriar os ânimos. Jonathan Castroviejo voltou a ser um elemento fundamental nas provas principais, Joshua Tarling foi brilhante na parte final da época e foi mesmo campeão europeu e fez pódio nos Mundiais de contra-relógio aos…19 anos, algo um bocadinho surreal. Michal Kwiatkowski fez o relógio recuar um bocadinho no tempo e ganhou de forma completamente merecida no Tour.

 

O menos

Dentro da categoria das desilusões do ano do pelotão internacional é normal que o primeiro mencionado aqui seja Daniel Martinez, um ciclista que venceu a Volta ao Algarve quando poucos achavam possível à partida do contra-relógio, e que depois desapareceu por completo, acabando por assinar com a Bora-Hansgrohe. A melhor versão de Martinez sempre foi e sempre será um ciclista capaz de liderar nas provas de 1 semana e de ajudar os líderes (como fez com Bernal) nas Grandes Voltas quando está bem.

Outro ciclista para as provas por etapas que não correspondeu foi Thymen Arensman, holandês que foi contratado à DSM. Terminou o Giro em 6º, mas nunca foi realmente capaz de andar com os melhores e para subir de nível tem de ganhar outra consistência ao longo do ano, não pode continuar a ser ciclista de terceiras semanas de Grandes Voltas.

Ethan Hayter esteve uns furos abaixo do que mostrou e conseguiu em 2021 e 2022, termina a época com 2 vitórias e sem mostrar evolução nas áreas que precisava de trabalhar, não melhorou especialmente na montanha, no sprint ou na colocação e não se pode queixar que a Ineos-Grenadiers não aposta nele, a formação britânica controla as corridas várias vezes para Hayter tentar finalizar. Luke Plapp continua a ser uma enorme incógnita, foi 2º no UAE Tour e depois parece que hibernou.

Esperava que Carlos Rodriguez estivesse um pouco mais próximo do nível de Pogacar ou Vingegaard, não posso dizer que uma temporada com o 5º lugar no Tour seja propriamente mau, continuo a ter expectativas muito elevadas sobre ele. 

 

O mercado

Foi das equipas que menos se mexeu neste mercado e até considero que ficaram mais enfraquecidos. Apenas assinaram com 3 ciclistas, Tobias Foss, que não se pode dizer que seja uma aposta segura, tremendamente inconsistente depois do título de campeão mundial de contra-relógio em 2022, Oscar Rodriguez, para ajudar na montanha, e AJ August, uma aposta de futuro.




Pelo contrário, perdem Pavel Sivakov, que sempre foi um corredor importante e impactante na montanha, Tao Hart, vencedor de uma Grande Volta e que até este ano partiu para o Giro como líder juntamente com Thomas, e Daniel Martinez, que obstante a sua inconsistência, era sempre uma opção para corridas de 1 semana. Também deixam a equipa 2 jovens talentos, Luke Plapp e Ben Tulett, que nunca chegaram propriamente a despontar.

 

O que esperar em 2024?

Esta atitude no mercado depois de uma época que não foi bem conseguida para os parâmetros da Ineos-Grenadiers foi muito estranha. Ou a equipa foi incompetente no recrutamento dos alvos identificados e perdeu poder de negociação pela descida na hierarquia do ciclismo mundial, ou confia cegamente na “prata da casa”, nos talentos que já estão na estrutura.

Creio que a formação britânica tem uma decisão complicada a tomar em relação a pilares estratégicos e planeamento da temporada. Têm de reconhecer que o bloco das Grandes Voltas está tremendamente enfraquecida face às estruturas rivais e julgo que têm de pensar um pouco fora da caixa. Em 2023 Filippo Ganna provou que realmente é um perigo em clássicas do empedrado, talvez não tanto em provas belga, mas também será um factor a ter em conta. A Ineos tem equipa suficiente para suportar uma aposta do italiano nessas corridas, deixando um pouco de parte as provas por etapas. Um bloco com Salvatore Puccio, Luke Rowe, Connor Swift, Ben Turner, Magnus Sheffield e até Michal Kwiatkowski e Jhonatan Narvaez será suficiente.

Eu, se fosse à Ineos, esquecia completamente a ideia de Pidcock para as Grandes Voltas, existe muito mais potencial nas clássicas das Ardenas, como de resto o britânico mostrou este ano. Nesta geração ainda não há grandes classicómanos, havia Valverde que se reformou e Alaphilippe que tem andado completamente fora dela. Apenas há voltistas que, pelas suas características, também se adaptam a estas corridas, e um Pidcock com o treino virado para esta vertente e chegando a 100% é muito perigoso, teria com ele parte do bloco das clássicas ao qual se juntaria Laurens de Plus e Omar Fraile.

Tendo em conta o histórico de resultados/lesões, creio que a Ineos não deve contar e depositar esperanças em Foss e Bernal, tudo o que venha de grandes resultados desses 2 ciclistas é um bom bónus, o “core” para as Grandes Voltas tem de ser Thomas, Rodriguez e Arensman, sendo que o holandês estará com menos pressão se for com liberdade e com a liderança partilhada. Rodriguez é um talento incrível, mas ainda parece um pouco longe do nível de Pogacar e Vingegaard, será boa ideia levá-lo novamente ao Tour e até que ponto isso contribui para a sua evolução? O espanhol pode ter legítimas hipóteses de ganhar se for ao Giro com esse pensamento e talvez possa mesmo fazer um programa com Giro-Vuelta, enquanto o Tour ficaria para o veterano Geraint Thomas, que este ano foi ao Giro com esse papel. Em 2022 Thomas ficou em 3º, foi o único dos “humanos” que por vezes esteve junto de Pogacar e Vingegaard, repetir o pódio seria já por si um excelente feito e é preciso lembrar que não esteve assim tão longe de ganhar o Giro este ano face a Roglic

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