Em equipa que ganha não se mexe. A receita para o sucesso da Alpecin-Deceuninck está encontrado, 2 grandes líderes que não são incompatíveis e que até te complementam e um conjunto de segundas linhas para os sprints e clássicas capazes de ombrear com os rivais.
Os dados
Vitórias: 35 triunfos, mais 1 do que em 2022. 8 deles em Grandes Voltas, 1 no Giro, 4 no Tour e 3 na Vuelta. 19 das 35 vitórias foram autoria de Jasper Philipsen.
Pódios: 75 pódios, uma formação que andou constantemente a subir aos primeiros lugares.
Dias de competição da equipa: 276 dias de provas, até foi mais do que em 2022, um número bastante normal para uma formação destas.
Idade média do plantel: 28,7 anos, um valor que se manteve, é uma estrutura com vários ciclistas experientes
Mais kms: O maratonista foi Senne Leysen com 11 853 kms, quase todos os elementos do plantel correram muito, mas nenhum que se destaque particularmente.
Melhor vitória: Um Monumento dificílimo de ganhar e que foi conquistado com um ataque histórico e um recorde do Poggio pelo meio, Mathieu van der Poel é mesmo um ciclista fenomenal e na Milano-SanRemo voltou a provar isso.
O mais
Incrível como uma estrutura destas tem 2 ciclistas entre os 10 melhores do Mundo. Jasper Philipsen acaba como o ciclista mais vitorioso do ano, também fez calendário para isso e notou-se que na parte final da época tinha esse objectivo. Mais importante do que isso, foi o melhor sprinter do ano, o melhor sprinter do Tour com 4 vitórias em etapa e a conquista sem espinhas da camisola verde. Para além disso mostrou ser um verdadeiro perigo nas clássicas, terminou no grupo dos sprinters na Milano-SanRemo, ganhou a Scheldeprijs e a De Panne, 4º na Dwars door Vlaanderen e foi 2º no Paris-Roubaix.
Mathieu van der Poel foi um corredor extremamente eficaz e “cínico”, fez somente 46 dias de competição. Usou a Strade Bianche e o Tirreno-Adriatico para aquecer para as clássicas onde ganhou a Milano-SanRemo, fez 2º na E3 e no Tour des Flandres, antes de subir ao lugar mais alto do pódio no Paris-Roubaix. Fez uma belíssima Volta a Bélgica, fez um Tour mais discreto onde ajudou Philipsen antes de se sagrar Campeão do Mundo e depois optou por descansar um pouco em vez de receber cachet por participar em algumas corridas menores. É incrível como nas grandes corridas o neerlandês aparece quase sempre a um grande nível.
Kaden Groves correspondeu na perfeição ao que a equipa pretendia, e foi para isso que ele saiu da Jayco, teve a liderança no Giro e na Vuelta, ganhou em ambos. Fez um calendário muito inteligente para um sprinter deste género. Soren Kragh Andersen também realizou uma belíssima temporada, esteve ao lado de Philipsen e Van der Poel nos momentos chave das clássicas e no Tour, teve oportunidades de liderar noutras corridas e mostrou ter capacidade para isso, voltou a estar próximo ao nível de 2020.
O menos
O ciclista que mais baixou de rendimento e que mais desiludiu foi Quinten Hermans. Depois de uma temporada em que foi sempre um corredor muito perigoso e até fez pódio na Liege-Bastogne-Liege e na clássica de Hamburgo, passou muito despercebido ao longo de toda a época. Termina o ano com 2 pódios, nenhum deles no World Tour, fez um Tour muito fraquinho e nas clássicas nem se deu por ele. Uma enorme oportunidade desperdiçada tendo em conta que tinha carta verde nessas corridas.
Com a entrada de Kaden Groves, Jakub Mareczko passou a ser o 3º sprinter da equipa, o italiano nunca foi consistente e nunca correspondeu às expectativas, portanto está de saída e deu lugar à nova geração (Kielich/Uhlig), um passo natural. Depois de subir o nível em 2022, havia muitas expectativas sobre Stefano Oldani, só que o italiano sai da equipa depois de um 2023 sem qualquer pódio e onde só apareceu a espaços no Giro. Podemos dizer o mesmo do promissor Robert Stannard, incrível sub 23 em 2018, que finalmente surgiu a bom nível em 2022 e que, tal como Oldani, termina a época sem pódios.
Esta equipa é um antro de oportunidades, qualquer trepador que consiga subir o nível não tem os caminhos tapados, infelizmente Nicola Conci não tem conseguido fazer isso e chances não lhe faltam, o mesmo se aplicando a Xandro Meurisse, que teve talvez a pior época nos últimos 8 anos.
O mercado
Ao contrário da temporada passada, creio que desta vez a Alpecin-Deceuninck sai mais enfraquecida deste mercado, perderam alguns ciclistas importantes e entraram jovens que ainda têm muito a provar.
Saem corredores como Jakub Mareczko, Robert Stannard e Stefano Oldani, que ao longo da sua estadia na formação belga não obtiveram os resultados desejados, no entanto também se transferem Dries de Bondt (importante nas clássicas), Alexander Krieger (excelente lançador) ou Kristian Sbaragli (bastante útil nas clássicas das Ardenas). Lionel Taminiaux também era um ciclista com alguma influência interna, bom sprinter, bom lançador.
Se perdem algumas certezas, entram muitas incógnitas. Veremos se esta é a estrutura certa para o campeão do Mundo sub-23, Axel Laurence mostrar o que vale, o mesmo se aplica a Stan van Tricht, super talento que não conseguiu demonstrar todo o seu potencial na Quick-Step. Timo Kielich foi brilhante a espaços em 2023 e tentará fazer as vezes de Mareczko, Boven e Hollmann são roladores, Uhlig é outro jovem sprinter e Vergallito o vencedor do Zwift Academy, um homem para a montanha, já com 26 anos.
O que esperar em 2024?
Julgo que com este mercado ficam um pouco enfraquecidos a curto prazo, não no que toca à liderança, Philipsen e Van der Poel devem continuar a dar garantias e muitos e grandes triunfos. O calendário dos líderes para 2024 deverá ser igual ao de 2023, não há grandes motivos para mudar, as principais clássicas para Philipsen (muito cuidado com o belga, no Paris-Roubaix provou que consegue fazer estragos) e Van der Poel, algumas clássicas mais secundárias e eventualmente o Giro e a Vuelta para Kaden Groves, a menos que possa despontar algum sprinter como Kielich, por exemplo. Para Groves ter garantida a liderança numa Grande Volta já não é mau.
A saída de Krieger e até Taminiaux enfraquece um pouco os comboios, mas ainda há Rickaert, Planckaert, Plowright, Janssens, Vermeesch ou Sinkeldam. Vai obrigar a alguma reformulação, ainda há matéria prima para trabalhar. Para apoiar Mathieu van der Poel nas clássicas ainda têm Kragh Andersen, Vermeesch, Dillier, Rickaert e até o próprio Van Tricht, acho um bloco sólido, mesmo sem Dries de Bondt. Creio que Mathieu van der Poel tem a plena noção de que é muito complicado repetir um ano em que ganha 2 Monumentos e é campeão do Mundo, o Tour des Flandres será novamente um grande objectivo.