Terminou ontem, na La Super Planche des Belles Filles, a primeira edição do Tour de France Femmes e foi uma corrida que não defraudou as expectativas. Foi um evento marcante, muito importante para o ciclismo feminino que está a crescer a olhos vistos na sua visibilidade internacional. Foram 8 dias de emoção, incerteza e muito espectáculo, uma corrida que vai ficar para a história pelos melhores motivos.



Foi um pelotão vasto e competitivo que embarcou nesta aventura em França dia 24 de Julho, apenas 2 semanas tinham passado desde o final do Giro Donne, uma corrida histórica no ciclismo feminino. Havia a perspectiva de nova luta pela classificação geral entre Annemiek van Vleuten e Marta Cavalli, com Demi Vollering (que não tinha ido ao Giro) à espreita, numa SD Worx que apostava muito no Tour. Será que Van Vleuten tinha capacidade física para conseguir a dobradinha? Cavalli tinha dado sinais de ameaça na última etapa de montanha do Giro Donne, tendo também batido a holandesa meses antes num duelo directo na Fleche Wallonne.

Infelizmente a italiana ficou pelo caminho logo ao 2º dia, quando numa queda colectiva foi abalroada pela campeã australiana de estrada, numa abordagem muito imprudente. Ficou Cecilie Ludwig a liderar a FDJ e a extravagante dinamarquesa não desapontou, venceu no dia seguinte com um sprint imparável em Epernay e terminou no 7º posto da geral. O Tour de France Femmes ficou obviamente marcado pelas prestações de “alien” de Annemiek van Vleuten, que no penúltimo dia, e precisando de recuperar tendo na geral, atacou a 85 kms da meta. Numa fase inicial, ainda levou Demi Vollering com ela, mas viria a deixar a sua compatriota para trás para lhe ganhar 3:26 e mais de 5 minutos à concorrência.

Incrível, como aos 39 anos, a ciclista da Movistar continua a surpreender com exibições deste calibre conseguindo valores até então nunca antes vistos numa jornada deste grau de dificuldades. Não é algo totalmente estranho para uma das melhores ciclistas de todos os tempos, veja-se o que conseguiu fazer no Mundial, em 2019, em Harrogate. Van Vleuten viria a ganhar também ontem, na Planche des Belles Filles, não dando hipóteses à concorrência. Curiosamente, dias antes tinha passado grandes dificuldades, entrou no Tour doente e mal conseguia comer. As principais rivais perderam grandes oportunidades de a deixar para trás e pagaram caro por isso.



Isso aconteceu nas etapas 3 e 4, antes disso Lorena Wiebes demonstrou a sua superior explosão nos Campos Elísios e Marianne Vos triunfou numa jornada marcada pelos cortes laterais, onde algumas das rivais colocaram 30 segundos sobre a grande favorita. Nas colinas da 3ª tirada, Van Vleuten passou por grandes dificuldades e cedeu mais alguns segundos, que poderiam ter sido muitos mais não fosse a inoperância do grupo dianteiro. Por exemplo, Ashleigh Moolman não ajudou Demi Vollering, até pareceu o oposto, e posteriormente não teria qualquer impacto na luta pela geral.

O mesmo aconteceu na jornada da gravilha, com a campeã do Giro Donne em algumas dificuldades não houve alianças e Van Vleuten minimizou as perdas e saiu desse dia com quase 1 minuto de atraso para as suas rivais mais próximas. Nesse dia, triunfou a Marlen Reusser. Antes do espectáculo da neerlandesa na alta montanha, teve oportunidade para recuperar forças nas etapas ao sprint, ganhas por Lorena Wiebes e Marianne Vos, esta última num grupo mais reduzido, numa etapa onde Wiebes caiu. Em resumo, a camisola amarela esteve sempre na posse de neerlandesas e 6 das 8 etapas foram ganhas por ciclistas deste país, que continua a ser a maior potência no ciclismo feminino, um caso de estudo desportivo e cultural.

Vollering foi a que mais próxima esteve da dominadora da competição, num claro choque geracional, visto que a nova líder da SD Worx tem menos 14 anos do que van Vleuten. Katarzyna Niewiadoma fechou o pódio e foi a melhor e a mais regular entre as “comuns mortais”, enquanto Juliette Labous foi 4ª. Silvia Persico foi a grande surpresa deste Tour de France Femmes, a italiana revelou uma capacidade para trepar como antes nunca tinha mostrado para fechar no 5º posto, ela que também tem uma boa ponta final, a Valcar continua a ser a melhor escola e a servir de ponte para jovens italianas que querem subir ao World Tour.



Longo Borghini pagou cara a factura da ousadia de tentar seguir Vollering e Vleuten na penúltima etapa, ficando no 6º lugar, seguida por Ludwig, Muzic, Ewers e de uma Mavi Garcia que teve uma corrida muito azarada. Marianne Vos foi a clara vencedora por pontos, diante de Kopecky e da regular Confalonieri, Vollering ficou com a camisola das bolinhas. Nas equipas, triunfou a Canyon/SRAM, muito graças ao trio Niewiadoma, Chabbey e Rooijakkers e Shirin van Anrooij foi a melhor jovem.

 

Nota: Devido a alguns comentários e questões que nos foram levantadas achamos por bem colocar esta adenda. Consideramos que ciclismo masculino e feminino têm a mesma importância, apesar de ainda não terem a mesma projecção. Acompanhamos com o mesmo afinco, fazemos equipas nos diversos sites também para o ciclismo feminino. Muito gostaríamos de ter tempo para o divulgar no panorama internacional tal como o fazemos com as corridas nacionais. Simplesmente pela duração da prova (8 dias) e pela sua calendarização chegámos à conclusão que, devido às nossas obrigações pessoais e profissionais (sim, este não é o nosso emprego e não é a nossa fonte de rendimento, nem o fazemos com essa intenção), não tínhamos condições para cobrir diariamente a prova como ela merecia e nesta página não fazemos semi-coberturas de provas só porque sim ou porque parece bem. Esperamos que na próxima temporada consigamos fazê-lo de forma diária e mais constante, assim as circunstâncias o permitam.




By admin